Nada nessa vida é por acaso...
Para vcs entenderem o pq da afirmação acima, vou começar falando de um projeto que estava prestes a ser concretizado, que deu início a um outro grande projeto. Grande de alma.
Tenho um grupo, O Grupo Simples de Teatro, que está desde junho do ano passado ensaiando uma peça para ser apresentada no Maranhão, mais precisamente na Baixada Maranhense. Temos uma parceria com uma ONG de lá chamada FORMAÇÃO, que faz um maravilhoso trabalho com os jovens de lá, de inclusão social, capacitação através da arte, do esporte, internet e tudo mais que possa dignificar a existência de jovens sem oportunidade, de classe social baixa, as vezes muito baixa, mas com muita vida e luz interior.
O projeto consiste em apresentarmos nossa peça por lá, sobre a realidade de São Paulo, em diversas cidades da Baixada Maranhense, enquanto o grupo de teatro de lá, formado por 30 jovens, faria outra peça, sobre a realidade do Maranhão.
Faríamos uma troca de experiências e disso resultaria uma terceira peça, com os dois mundos encaixados. Um intercâmbio de idéias e experiências.
Alguns membros do grupo já foram para o Maranhão para dar oficinas de interpretação, direção e editais culturais para esses jovens. Enquanto isso, dois Arte-educadores de lá vieram para cá para fazer um tour cultural por aqui, com o nosso grupo tentando mostrar o que São Paulo tem de melhor culturalmente.
Nossa ida estava prevista para meados de janeiro, quando em dezembro, a bomba de que a verba não saiu pairou sobre nossas cabeças, deixando algum desânimo e egos feridos... Mais uma vez o dinheiro seria o empecilho para o teatro andar.
Acabou que a verba foi conseguida para que apenas um membro do grupo, músico, multi-instrumentista e que trabalha com percursão corporal, fosse para lá, para dar oficinas para esses jovens e demais músicos do Maranhão. Pronto. O intercâmbio foi feito de alguma forma, e nada mais parecia ser em vão.
Depois de uma conversa com o grupo, resolvemos estrear em São Paulo, enquanto aguardamos a verba sair para fazermos o intercâmbio cultural.
Acontece que o dinheiro é inexistente, e novamente teríamos que pedir dinheiro para amigos, mãe, pais, etc para conseguirmos verba para estrear em São Paulo, que primeiramente consiste em pagar o aluguel do teatro, figurino, cenário, técnicos de luz e som (é óbvio que os atores e a direção não ganhariam nada...)
Mas para um grupo, engajado em fazer um trabalho de arte social, da arte como veículo para o crescimento e dignificação humana, estrear em São Paulo num teatro pago e para um platéia de amigos parecia ser inútil...
Foi quando a diretora teve a brilhante idéia de fazermos o intercâmbio aqui em São Paulo mesmo. Não era preciso ir até o Maranhão para ver a dura realidade dos brasileiros, aqui a pobreza e falta de oportunidade são igualmente assustadoras.
Daí entra a favela de Heliópolis. Só para dar um panorama, o local tem UM MILHÃO de metros quadrados e 125 mil habitantes. É um bairro de São Paulo que quase chega à cidade de São Caetano.
As informações que eu sei, por enquanto: O local é dividido em núcleos, enquanto uma associação, a UNAS, cuida desses núcleos oferecendo dignidade a crianças e adolescentes, dando arte, esporte, capacitação, rádio legalizada...
Nem todos os jovens e crianças estão nesses núcleos, provavelmente por falta de vagas. Então além dos núcleos existe a comunidade como um todo.
O teatro não está estabelecido em Heliópolis. Existem grupos de dança, rap, grafite, percursão em lata... E é aí que entra o Grupo Simples de Teatro.
Nossa peça estreará em Heliópolis, uma vez por semana, para uma platéia de no mínimo 100 pessoas por apresentação. Isso pq inicialmente faremos as apresentações somente para os núcleos. Mais tarde abriremos essas apresentações para a comunidade em geral. E ai esperamos que a platéia aumente.
Com certeza será o maior público que já tivemos na vida e com certeza, o mais necessitado de arte e ávido por cultura e entretenimento.
Alguns membros do grupo farão oficinas de teatro para crianças e jovens de lá e num futuro, capacitação de jovens, para que eles possam dar continuidade no fazer teatral em Heliópolis.
A felicidade é imensa, de poder levar a nossa arte para pessoas que brilham os olhos só de ouvirem falar nela...
O contentamento e o preenchimento da alma de artista transborda, sabendo que estamos fazendo a arte para o que e para quem deve ser feita.
Tivemos uma reunião ontem e saimos de lá realizados. Realizados por poder dar essa oportunidade para nós e para eles.
Nada nessa vida é por acaso. O Maranhão é aqui. Heliópolis nos espera e esperamos ansiosamente também. O Maranhão também nos espera, ávidos por trocar as experiências que teremos em Heliópolis. A Arte é capaz de transformar. Não só o público, mas principalmente, os ARTISTAS.
PS: Nunca a idéia de fazer teatro sem dinheiro foi tão gratificante.